terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

O SUBMUNDO DAS TRINCHEIRAS


Olá pessoal! É um prazer enorme retornar as atividades do blog neste ano de 2012. Espero que este seja um ano proveitoso e que o blog possa possibilitar relevantes momentos de reflexão sobre fatos ocorridos ao longo da História a partir da leitura de imagens históricas. Sendo assim, sejam bem vindos a temporada 2012 do blog “HISTÓRIA POR IMAGEM”.
A imagem acima proposta para nossa análise, refere-se a Primeira Guerra Mundial que ocorrera na segunda década do século XX. Confesso que não foi fácil escolher uma imagem para esta postagem, diante das inúmeras fotografias que registraram a realidade que os soldados enfrentavam na segunda fase do conflito, fase esta conhecida como “guerra de trincheiras”. No entanto, esta fotografia parece-me que bem transmite a agonizante vida dos combatentes no maior conflito armado que a humanidade até então havia presenciado.
A trincheira, adotada como uma tática de guerra, nada mais era que um corredor cavado ao chão, uma espécie de um parapeito, que serve de abrigo e proteção para os combatentes em um conflito, como podemos observar na imagem a seguir.

Na verdade, a tranquilidade aparente que se observa na foto acima, causa-nos a impressão de um certo ar de familiaridade dos combatentes com o local, e de fato a trincheira acabava se tornando um espaço familiar, aonde as tropas passavam semanas expostas ao tempo, entregues a sorte e à condições sub-humanas de sobrevivência. Ali, em meio a “tempestade de munições”, dos mais variados tipos, os soldados compartilhavam alimentos, água, bebidas alcóolicas, histórias, saudades, cansaço e dores. O posicionamento em trincheiras tornava difícil a derrota da tropa adversária, o que fazia com que o conflito se estendesse por muito tempo e, dessa forma, logo os sinais de desgastes físicos, emocionais e de baixa nos estoques de alimentos, recaiam sobre os combatentes, como podemos acompanhar num depoimento contido em uma carta encontrada no bolso de um soldado alemão na Batalha do Somme (1916):
“Estamos tão exaustos que dormimos, mesmo sob intenso barulho. A melhor coisa que poderia acontecer seria os ingleses avançarem e nos fazerem prisioneiros. Ninguém se importa conosco. Não somos revezados. Os aviões lançam projéteis sobre nós. Ninguém mais consegue pensar. As rações estão esgotadas – pão, conservas, biscoitos, tudo terminou! Não há uma única gota de água. É o próprio inferno!”
(Fonte: J. M. Roberts (org.) História do Século XX. In: Adhemar Martins Marques et al. História Contemporânea através de textos. São Paulo: Contexto, 1994. p.120).
Além do desgaste físico, emocional e do stress expressos no depoimento, torna-se evidente a desilusão com a guerra, antes almejada por boa parte dos cidadãos das potências envolvidas, por estar associada ao progresso e a prosperidade econômica que recairia sobre a  nação vitoriosa. A visão do próprio inferno, descrita pelo combatente alemão clarifica-se ainda mais, quando o historiador Ken Hill, descreve em seu livro "A Primeira Guerra Mundial", a realidade diária enfrentada pelos soldados numa trincheira:
A vida nas trincheiras era horrível. Quando chovia, o que é comum na região, os túneis inundavam. E os soldados tinham que lutar, comer e dormir por semanas com os uniformes encharcados. Havia lama por todos os lados, às vezes atingindo até o peito dos homens. Eles não podiam manter-se aquecidos, e as doenças se espalhavam, matando milhares de pessoas diariamente. Para completar, os vivos sofriam com os piolhos, enquanto os ratos se alimentavam dos cadáveres. (Hills, Ken. A Primeira Guerra Mundial. p. 7.)
Acredito piamente que esta horripilante descrição do submundo vivenciado nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial, casam perfeitamente com a imagem inicial desta postagem, daí a razão da minha escolha pela mesma. Contudo, podemos concluir que a Primeira Guerra ainda hoje é considerada uma das maiores carnificinas que já ocorreram na história da humanidade, a estupidez estatal que em nome de um manipulado patriotismo esquece-se de que nos campos de batalhas não estão a oportunidade de crescimento. Sendo assim, os seres humanos que ali estão, detentores de planos, de sonhos, laços afetivos (família, amigos, etc.), são capazes sim, de erguer uma nação pela força do trabalho e não da guerra.
Ficamos por aqui, deixo um excelente vídeo relacionado a guerra de trincheira na Primeira Guerra Mundial e que acredito servir para bem ilustrar este conteúdo em sala de aula.

Se és simpatizante do blog HISTÓRIA POR IMAGEM, divulgue-o.
Saudações!

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

PAPAI NOEL, SÃO NICOLAU E A COCA-COLA

Olá pessoal!

Está chegando o final do ano e com ele os festejos natalinos, e por falar em Natal, não poderíamos deixar de abordar uma figura histórica referente a este período do ano: o PAPAI NOEL. Várias versões e relações são criadas, recriadas, contadas e estabelecidas sobre o surgimento desta lenda natalina. Ao longo da pesquisa realizada para esta postagem pude perceber que o processo de criação deste relevante personagem natalino, tal qual o conhecemos nos dias atuais, tem estreita relação com religiosidade, tradição e o sistema capitalista.

São Nicolau
A história do Papai Noel, embora alguns religiosos rebatam esta tese, tem relação com São Nicolau, santo da Igreja Católica. Vejamos um trecho de uma hagiografia, uma espécie de biografia dos santos produzida pela Igreja Católica na Idade Média:
Nicolau nasceu no ano de 270, na cidade de Patara, no sul da atual Turquia, na Ásia Menor. Os seus pais eram cristãos devotos e, desde crianças, ele mostrou-se um predestinado. Ficou órfão muito jovem e decidiu usar sua herança em obras de caridade. Andou em peregrinação pela Terra Santa e pelo Egito e, quando voltou à terra natal, tornou-se o bispo de Myra. Foi exilado em 303, quando a religião católica foi proibida ali. Morreu em 343 e foi enterrado em Myra.
Conta-se que Nicolau dedicou sua vida à caridade e aos atos de benevolência, muitos deles conhecidos. O mais famoso é o episódio em que ele salvou três irmãs muito pobres, que não podiam se casar porque o pai não tinha como pagar, os seus dotes. Sem o casamento, naquele tempo, as mulheres perderiam sua honra. Nicolau deu a elas uma oportunidade de ter uma vida digna, atirando, de noite, três sacos com ouro suficiente para os dotes de cada uma das moças. Essa história ganhou várias versões diferentes, o que a transformou em lenda.
Em razão de seus atos, depois de morto, passou a ser honrado, venerado e reconhecido como santo milagreiro. No final do século XI, suas relíquias, consideradas miraculosas, foram transportadas por um grupo de mercadores italianos para a cidade de Bari, na Itália, onde até hoje há um santuário, que virou local de peregrinação.
São Nicolau foi nomeado padroeiro das crianças, dos estudantes, dos marinheiros, dos solteiros e da Rússia. Criou-se a tradição de, no dia 6 de dezembro, dedicado ao santo, dar presentes às crianças, seguindo o seu exemplo. (MAGALHÃES, Gustavo Celso; HERMETO, Miriam. Coleção Pitágoras. 2010)


Representação de São Nicolau.
Nesta imagem ele já aparece mais velho e pela roupa que usa nos leva a acreditar
que já desempenhava a funçãode bispo católico.
Repare como suas características físicas já
possuem uma semelhança com a imagem atual do Papai Noel.
Diante disso, devemos nos apegar principalmente ao fato de que o ato de caridade de Nicolau em relação às três meninas apontadas pelo texto, se tornou uma tradição, a de dar presentes no dia dedicado ao santo. Anos mais tarde esta tradição foi transferida para o Natal. No entanto a fama de Nicolau foi ganhando ao longo dos anos uma proporção grandiosa, como nos mostra o texto abaixo:
Na Europa, o culto a São Nicolau só cresceu depois do século XI, espalhando-se enormemente. Ele passou a ser considerado o patrono da Rússia e várias igrejas foram criadas em sua homenagem, pelo mundo cristão. Na Alemanha, manteve-se a tradição de dar presentes no dia de São Nicolau. Com o tempo, sua imagem passou a ser associada às festividades de Natal, que se transformou em uma festa famosa e popular. E a lenda do bom homem que distribuía presentes natalinos cresceu mundo afora, assim como o hábito de trocar presentes.
Mas, parece, foi nos Estados Unidos, a partir do século XIX, que são Nicolau começou a ser associado à lenda do Papai Noel. Foi ali que se construíram as características do Noel que o mundo ocidental mais conhece hoje. Como toda lenda, essa pode ter sido construída por vários caminhos e tem muitas versões. Mas um desses caminhos é conhecido atualmente.
Em 1822, Clement C. Moore escreveu um poema para seus filhos, chamado “A Visit from St. Nicholas” (Uma visita de São Nicolau). Ele narrava a história do velhinho que passava em um trenó puxado por renas e entrava nas casas pelas chaminés.
O primeiro desenho retratando a figura do Papai Noel como conhecemos nos dias atuais foi feito por Thomas Nast e foi publicado na revista Harper’s Weekley, na edição especial de Natal do ano de 1866. O desenho retratava o bom velhinho com bochechas rosadas, uma vestimenta marrom e uma coroa de azevinhos (um tipo de planta usado nas decorações natalícias) na cabeça. Observe abaixo, como o Papai Noel feito por Thomas Nast, já apresentava características físicas bem semelhante ao da atualidade.
Papai Noel criado por Thomas Nast.

A última característica incluída na figura do Papai Noel é sua blusa vermelha e branca. Essa imagem se popularizou de vez, depois do uso que a Coca-Cola fez dela em suas propagandas.
O produto já existia desde o final do século XIX, e era vendido, incialmente, em farmácias. Por volta de 1930, a empresa fez uma campanha, em busca de um público mais jovem. Contratou um desenhista que recriou o Papai Noel: um velhinho gorducho, com um sorriso simpático e vestido com as cores da marca da Coca-Cola.
Na segunda metade do século XX, a Coca-Cola só cresceu, tornando-se conhecida e consumida no mundo inteiro. Com ela, a imagem do velhinho de vermelho circulou pelo mercado global e, praticamente, tornou-se a imagem oficial do Papai Noel. (MAGALHÃES, Gustavo Ceslso; HERMETO, Miriam. Coleção Pitágoras. 2010)
Papai Noel criado pela Coca-Cola.

Diante de tudo, segue a discussão sobre o impasse daqueles que defendem que o Papai Noel deve ser considerado um símbolo da cultura natalina e daqueles que o julgam como um ícone do sistema capitalista que representa apenas o consumismo. No entanto, ao darmos uma conferida na História e no processo de criação deste polêmico e porque não dizer, controverso personagem, veremos que no fundo, lá em sua essência original, ele possui um pouco dos dois, da religiosidade pelo fato de que a sua principal ação, a de dar presentes às crianças, está ligada a uma tradição católica, esta fruto da caridade feita por São Nicolau e também do consumismo, já que com o advento do sistema capitalista, dar presentes, se tornou sinônimo de comprar presentes, ou seja, consumir, pelo menos é essa conotação que o comércio tenta nos impor em todo período natalino.
Ficamos por aqui, um forte abraço e um ótimo Natal a todos!


terça-feira, 29 de novembro de 2011

SOCIEDADE FRANCESA NO FINAL DO SÉCULO XVIII

Caricatura Francesa do final do século XVIII.
Biblioteca Nacional de Paris

Olá pessoal! Bom estar com vocês mais uma vez.
Nesta postagem analisaremos o simbolismo de uma caricatura francesa do final do século XVIII. No decorrer da postagem faremos uma associação desta com a realidade vivida pela sociedade francesa a luz daquela época.
Para melhor fazermos essa associação aqui proposta, cabe-nos explanar rapidamente acerca da configuração social francesa no final do século XVIII. Então vamos lá!
Naquela época a França era composta de aproximadamente 24 milhões de habitantes e nessas condições, era disparadamente o país mais populoso do continente europeu. Outro fator que merece destaque é a desigualdade social existente entre os franceses daquele período. Submissa a um sistema político absolutista, a sociedade francesa era dividida em três estados ou grupos sociais como podemos ver abaixo:
Primeiro Estado: Composto pelo clero da Igreja Católica que curiosamente se dividia em duas classes distintas: o alto clero (cardeais, bispos e abades) e o baixo clero (padres, frades e monges). Na realidade o alto clero gozava de privilégios estatais e pelo fato de legitimar o poder real, lhes era concedido a isenção do pagamento de tributos (impostos). De contrapartida, o alto clero possuía um poder de arrecadação de tributos invejável, alicerçado na cobrança do dízimo, das altas taxas que eram exigidas dos fiéis na realização de batismos, casamentos e sepultamentos. A riqueza acumulada pela Igreja ainda bebia de outra importante fonte, as terras. O alto clero concentrava uma grande quantidade de terras e consequentemente um número muito grande de trabalhadores que prestavam serviços e pagavam excessivas taxas.
Segundo Estado: Esta parcela da sociedade francesa era composta pelos integrantes das famílias tradicionais, também conhecidos como nobres. Para a nobreza também eram destinados privilégios reais, como por exemplo, o não pagamento de impostos, cargos públicos importantes, dentre outros. A nobreza francesa era também detentora de grandes propriedades de terras e consequentemente possuíam muitos servos que trabalhavam nestas terras e pagavam pesados impostos aos nobres.
Terceiro Estado: Este grupo social era composto pelos camponeses, trabalhadores urbanos e a burguesia que juntos equivaliam a aproximadamente 98% da população francesa. A eles não eram destinados nenhum tipo de privilégio real, muito pelo contrário, recaia sobre estes o pesadíssimo fardo do pagamento de impostos e para os camponeses, em especial, lhes eram acrescidos ainda, as obrigações feudais. Na realidade era o Terceiro Estado que sustentava os outros dois, ou seja, 98% de pobres, miseráveis sustentando as regalias e os privilégios de 2% de ricos.
Bom... agora que conhecemos um pouco a realidade de cada grupo social francês daquela época, passemos a observar a caricatura proposta. O traje de cada um dos personagens, torna fácil a identificação dos mesmos, sendo assim, o primeiro que está acima ou nas costas do velho, traz ao peito um crucifixo, trata-se de um integrante do clero, provavelmente do alto clero. O Segundo personagem que está nas costas do velho, carrega consigo uma espada, além disso, repare como está muito bem vestido, dessa forma podemos concluir que trata-se de um nobre. Por fim, o velho, carrega nas costas os dois, o nobre e o religioso. Com uma expressão de sofrimento, cansaço, parece não aguentar mais por muito tempo o fardo que carrega sozinho.
A caricatura é fantástica, a disposição dos personagens é perfeita, observe atentamente. Em primeiro (acima) vem o 1º Estado, representado por um integrante do alto clero, logo atrás dele vem o 2º Estado, representado por um nobre e por último (abaixo) vem o 3º Estado, representado por um camponês, a identificação deste torna-se evidente não só pela roupa desgastada que ele usa, mas também pela presença de ovelhas e passarinhos que comem sementes ao chão, tornando o ambiente pelo qual se passa a cena, rural.
Simbolicamente a cena retratada chama a atenção da sociedade francesa da época para a questão da exploração sofrida pelos camponeses que, ao trabalhar nas terras pertencentes ao clero e a nobreza, acabavam por sustentar, através do sistema servil e dos tributos pagos, o 1º e 2º Estados.
Para finalizarmos, confesso que tentei procurar a autoria da caricatura aqui analisada, mas ela está em anonimato, o que não nos impede de tecer elogios ao indivíduo que a criou, pois o mesmo conseguiu sintetizar os problemas oriundos a desigualdade da sociedade francesa em apenas um simples desenho, em uma simples imagem.

Forte abraço a todos e saudações históricas!